sexta-feira, 9 de julho de 2021

SOMBRAS DO NADA: A RAINHA NAS SOMBRAS (ATO 3)

Escrito por
MIKE WEVANNE

Dedicado para
ERGA

3.

Everton se entregou aquela escuridão. Era um lugar frio, mas confortável. Ele sentia o toque de Estér, sentia o sangue fervendo em suas veias. Todo o poder que vinha dela e fluia até seu corpo, dominando toda sua vontade. Ele era Dela.

Buscando-a, ela sorriu em troca. A voz da deusa ressoou através da vastidão escura respondendo à devoção de Everton, num tom tão doce quanto ardente. Ele dedicou mais uma vez a sua atenção sobre ela e delirou pelas curvas daquele corpo, pela palidez da pele macia, pelas coxas e seios voluptuosos. Mais uma vez aqueles lábios vermelhos chamaram seu nome… O convidaram. Então sentiu algo pulsante e molhado dentro da cueca.

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Um estrondo rompeu aquela quietude e invadiu a sala de Everton. Homens vestidos de colete, pistolas empunhadas. Avançaram sobre o lugar como uma onda, varrendo a escuridão com a luz de suas lanternas.

— Polícia civil! Não se mexa! — Mas a ordem atingiu ouvidos que pareciam estar alheios ao que acontecia em volta.

— Que caralho de cheiro é esse??? — Foi o que um dos policiais disse enquanto a ânsia revirava seu estômago. Sua mão buscou o interruptor de luz.

A claridade revelou a bagunça do lugar. O chão e os móveis estavam manchados com algo que era de um vermelho quase negro. A atenção de alguns agentes estava presa no que havia sobre a mesa de jantar: uma massa viscosa de carne apodrecida, pêlos e ossos partidos, no que parecia ser um animal estripado.

— Isso era um gato? — Alguém tentou adivinhar. Outros policiais seguiam através do restante do apartamento.

— Milton, você precisa ver isso aqui! — O aviso veio da cozinha, chamando pelo investigador encarregado que estava tentando decifrar o homem catatônico no sofá da sala.

Havia um cadáver na cozinha, o corpo de uma mulher, de bruços sobre a bancada. A cabeça estava esmagada, os pedaços do crânio e do cérebro estavam espalhados entre várias tigelas com leite azedo e biscoitos mofados. O fedor de carniça era insuportável ali, dois policiais correram até a pia para vomitar, mas só um deles chegou lá a tempo.

Depois de terem se certificado da segurança do lugar, o investigador Milton voltou para a sala. Apenas aquele cômodo, além da cozinha, possuíam a anormalidade sinistra do lar de um psicopata. O resto do apartamento estava arrumado e limpo. Todos estavam com a atenção voltada para Everton, que até então não tinha esboçado reação alguma ao que estava acontecendo à sua volta. Apenas olhava para a TV, desligada, com o olhar perdido, louco, fascinado por algo que não estava lá.

O investigador se posicionou entre aqueles olhos e a TV, encarou Everton e estalou os dedos diante do seu rosto. O advogado piscou os olhos e o encarou de volta, como se estivesse procurando por alguém que havia lhe chamado de um lugar distante.

Então os policiais o agarraram pela camisa, Everton foi jogado ao chão e algemado, mas apenas quando começaram a puxá-lo para fora do apartamento que sua passividade deu lugar a uma agitação seguida por estado de desespero.

— O QUE VOCÊS FIZERAM??? — Ele escorregou por braços desavisados e deu uma cabeçada que quebrou o nariz de um dos policiais que o detinham. O outro que tentava mantê-lo sob controle recebeu uma mordida no braço.

Os olhos vidrados e a boca espumante mostravam o tipo de determinação que havia tomado o corpo do assassino Everton. Quatro agentes tiveram que empreender esforço para conter um homem que visivelmente estava fora do padrão de uma forma física saudável.

— Vocês! Vocês não podem me levar para longe DELA!

Naquele momento os policiais que haviam sido machucados por ele estavam decididos a dar o troco: o golpe de um cacetete abriu o supercílio esquerdo de Everton, o sangue jorrando dali escorreu por sua face, cobrindo-a de vermelho. Os joelhos do advogado vacilaram e depois de um empurrão seu rosto carimbou a parede com uma mancha vermelha, então tropeçou e caiu no chão. Sentiu o impacto de um coturno contra o seu queixo, o estalou denunciava a fratura da mandíbula. Caído, ele cuspiu sangue e alguns dentes.

Porém a surra não fez Everton ficar manso. Os policiais necessários para levá-lo através do corredor do prédio já eram seis.

— Socorro! Eles tão me levando! Minha Senhora! Desculpa! Eles tão me levando! Esses putos estão me levando! Esses merdas!

— Pelo amor de deus, alguém faz esse desgraçado calar a boca! — Milton sentiu um calafrio quando olhou pro corredor vazio atrás deles para onde Everton dirigia seus protestos.

— Me espera! Minha Rainha! Eu vou voltar! Juro que vou voltar pra Senhora! Eu juro!

Então Everton parou de se debater. Seu rosto mostrou a apatia com que os policiais haviam o encontrado e ele se deixou conduzir passivamente, apesar da violência com que continuava sendo tratado. Milton mandou pararem com aquilo e levarem-no logo embora. Sentiu que havia algo errado e não queria provocar o que quer que estivesse lhe trazendo aquela sensação inexplicável de alerta.

O policial olhou novamente para o corredor pelo qual tinham passado, não conseguia racionar o que havia lhe perturbado mais em toda aquela cena de crime dantesca, mas pensou ter ouvido um baixo e terno "shhh..." vindo das sombras. Uma presença. Em sua mente enxergou a mulher pálida de vestido e cabelos negros, com o dedo diante dos lábios carnudos ordenando:

— Shhhh...

Milton piscou mas não havia nada, apenas o corredor. Ele olhou para os outros e era como se apenas ele e Everton tivessem ouvido aquilo, mas inexplicavelmente todos ficaram calados e um certo clima de apatia continuou durante todo o resto da prisão.

FIM

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Saudações joviais, 3d6 leitores!

É isso, depois de um longo, looongo hiato, consegui finalizar A Rainha nas Sombras! Nesse momento eu gostaria de deixar alguns pontos para aqueles que me honraram com sua atenção até aqui:

Primeiramente, #forabolsonaro!

Segundamente, peço perdão pelo vácuo entre a última postagem e este texto aqui. Infelizmente os dias andam passando rápido demais para meu cérebro processar enquanto tenta lidar com as muitas mazelas que não apenas assolam o país, como também assediam a minha saúde física e mental.

Terceiramente, é fato que eu detesto dar desculpas, prefiro corrigir meus atos do que justificá-los. Em todo caso o disclaimer serve como uma prestação de contas para que seja dado o devido respeito a quem acompanha minhas desventuras escritas.

Então para vocês leitores, aqui vai tanto meu agradecimento por não desistirem deste pretenso escritor, quanto meu pedido de perdão pelo sumiço.

Vamos ver o que as Musas nos resevam no caminho adiante! E que Bons Ventos voltem a soprar palavras neste blog.

See ya!

MWXS

PS: lembrando que para conferir o capítulo anterior basta seguir este link.

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